Estas construções são perfeitamente padrão também em Portugal. O que tal? dos teus exemplos é um fragmento que o interlocutor completa com a informação anterior. A pergunta completa seria:
Que tal o meu carro?
Que tal o meu vestido novo?
Aqui há um verbo omisso. Há muitos que ficariam ali bem:
Que tal ficou/está/achas/te parece o meu carro?
Atualmente é mais comum omitir o verbo, mas encontram-se as frases completas:
Então que tal achas o meu vestido novo? (Almanach Bertrand, 1906.)
Que tal ficou o meu retrato? (Sérgio Cabral, No Tempo de Ari Barroso, 1993.)
Que tal é êle?
(António Augusto Fagundes, Destino de tal: novela gauchesca, 1962.)
E que tal está o novo CD e DVD, o acústico Bandadois?
Entrevista de Gilberto Gil ao Estadão, 2009, via Jeito Baiano.)
Este que tal significa ‘como’; nalguns casos poderá ser ‘o que’ (que tal te parece?). E existe também pelo menos em Castelhano, que aliás partilha muitos dos nossos usos de tal. Talvez a saudação que mais comumente ouço a amigos de língua castelhana, espanhóis ou latino-americanos, seja precisamente qué tal?, onde tal como entre nós há um verbo omisso. No Spanish SE, a reposta mais votada a esta pergunta apresenta como equivalentes:
¿Qué tal?
¿Qué tal estás?
¿Qué tal va todo?
¿Qué tal andas?
Agora donde é que isto vem? Segundo o Houaiss tal vem do latim talis,e, onde significava ‘igual, semelhante, tão grande, tanto’. No português isto veio a dar uma porção de usos (ver Aulete), e os sentidos originais transparecem em muitos deles. Por exemplo:
Tal pai, tal filho vem de qual pai, tal filho = qual pai, igual, semelhante filho.
Nunca tal coisa vi = nunca vi coisa igual, semelhante; essa coisa; coisa assim.
X, Y e outros que tal = e outros semelhantes, do mesmo tipo; outros assim; outros como X e Y.
Não é difícil imaginar o nosso que tal, ‘como’, a surgir no meio disto tudo. Em muitos usos, tal X significa X assim; nós não perguntamos que assim é isso? porque não nos deu para aí: em vez disso perguntamos como é isso? ou que tal é isso?
Este uso já vem pelo menos do século XVI. O exemplo mais antigo que encontrei é da obra de Gil Vicente (1465 – 1537; Wikipédia):
Que tal te parece este pastor que aqui vem em nossa companhia?
(Gil Vicente, Obras Completas, 1966.)
Depois temos um exemplo de 1552, no romance de cavalaria Palmeirim de Inglaterra, de Francisco Moraes:
A empreza , que dizeis que jure , queria que me disseis , que tal é ;
Neste caso, parece-me que que tal significa ‘que isso’ (Aulete 2). Mas também poderia ser ‘como’. Esta plasticidade do tal provavelmente facilitou a proliferação de usos que lhe viemos a dar.
No século XVIII encontrei o primeiro uso sem verbo, aqui facilitado por haver um verbo na frase anterior (ênfase minha):
Que tal foi vossa devoção , e sorte? Que tal o milagre do vosso idolo ?
(Joaquim de Santa Rita, Academia dos Humildes e Ignorantes, 1762.)
Mas em 1824, n’O Spectador Brasileiro, já temos um exemplo cem por cento sem verbo:
Meteo muita gente na folia , jurou , e tornou a jurar de não desamparar o campo da batalha […] e nesse mesmo dia (12 do passado) sem dizer aqui ficaõ as chaves, voou para bordo da corveta Ingleza, e lá foi por esses mares zombando de todos—Que tal o maganão?
E o resto é aquilo que nós sabemos.