A pluralização de abreviações por duplicação das letras é aconselhável apenas nos casos já consagrados, como VV.MM. ‘Vossas Majestades’, SS.MM. Suas Majestades, VV.AA. ‘Vossas Altezas’, etc. O que muitos gramáticos recomendam e o uso vem consagrando é a formação do plural pela adição de um s minúsculo: uma ONG, duas ONGs (‘organização não governamental’). Por exemplo, este artigo no Gramaticalhas cita quatro gramáticos que aprovam a formação do plural de siglas com s. É essa também a recomendação no Manual de Redação da Folha de São Paulo e no Manual de Comunicação do Senado Federal do Brasil). A única posição discordante que encontrei (Ciberdúvidas e Dúvida Linguística no FliP) recomenda manter a sigla invariável: uma ONG, duas ONG.
Agora, tudo isto são apenas recomendações. Como diz Cláudio Moreno (“Plural das Siglas”,Sua Língua), que também aprova o plural com s, “não há um deus da gramática”, e o Acordo Ortográfico em vigor nada diz sobre o assunto. Por isso não podemos dizer que o plural por duplicação de letras fora dos poucos casos consagrados seja um erro ou uma afronta às regras ortográficas atuais; mas vai com certeza contra a prática corrente. E cada um dirá qual das seguintes formas melhor favorece a comunicação (“notícia” inventada):
Várias OO.NN.GG. pediram à C.P.L.P. (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que melhorasse o seu site. Mas parece haver duas CC.PP.LL.PP, uma interessado em progredir, outra em protelar.
Várias ONGs pediram à CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que melhorasse o seu site. Mas parece haver duas CPLPs, uma interessado em progredir, outra em protelar.
Várias ONG pediram à CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) que melhorasse o seu site. Mas parece haver duas CPLP, uma interessada em progredir, outra em protelar.
Eu prefiro a versão com s, que é aliás a que vem ganhando consenso. A versão com letras dobradas deixaria muitos leitores a coçar a cabeça.
Um argumento a favor do s é que nós tendemos a tratar as siglas, mesmo aquelas pronunciadas por soletração (como CD, que é lido como cê-dê, ao contrário de ONU), como uma palavra, e é por isso natural acrescentar um s, para formar o plural, lendo-se um cê-dê, dois cê-dês (ver artigo do Cláudio Moreno). Isto é válido, naturalmente, apenas para siglas que designam entidades singulares que podem ser pluralizadas: uma ONG, duas ONGs. Algumas siglas já são gramaticalmente plurais, como os EUA, não havendo necessidade de indicar o número plural com s ou dobragem de letras. Encontrei de facto alguns exemplos de EE.UU. em textos do século XIX, mas não vejo nessa sigla qualquer mérito. Mas eu diria, “existem dois EUAs [e-u-ás], um urbano, outro rural”.
Quanto à citação de textos antigos, é perfeitamente legítimo reproduzi-los fielmente, juntando notas explicativas se necessário. É aliás boa prática em qualquer texto indicar por extenso o significado da sigla, exceto as sobejamente conhecidas, na primeira vez que ela aparece no texto. Depois, em domínios específicos pode haver normas ou tradições próprias. O plural das siglas não está regulamentado; a explosão de siglas é uma coisa relativamente recente na história da língua, e o consenso está ainda em formação. Portanto é uma questão de bom-senso e ver o que favorece a comunicação.
Onde há consenso é que não se usa apóstrofo: ONGs, tudo bem, mas não *ONG’s. Este uso do apóstrofo é provavelmente influência do inglês, mas mesmo aí ele é desaconselhado salvo raras exceções (ELU.SE). No passado indicava-se a parte de cada palavra numa sigla com um ponto (E.U.A., O.N.U), mas a tendência atual é para evitar esse “entulho gráfico” (Veja, manuais da Folha e do Senado). No entanto, os pontos são usados nos plurais com letras dobradas. Por razões históricas—esses plurais são heranças do passado—e ajudam-nos a saber que cada duas letras representa uma só palavra, por exemplo: SS.MM. é ‘Suas Majestades’ e não, por exemplo, ‘sem sal é muito melhor’.
O plural das letras pode formar-se por duplicação ou acrescentando um s ao nome da letra: aa ou ás, bb ou bês, ff ou efes, hh ou agás, etc., como explicado na resposta a esta pergunta. Isto é no entanto uma questão diferente: por exemplo, vv referem várias letras v, como em, “há três vv em vavavá”; em VV.MM os dois vv referem a palavra vossas, não referem letras.