Em português, o Pretérito Perfeito Composto do Indicativo tem um uso bastante diferente da maioria das outras línguas próximas; possui aquilo a que por vezes se chama um aspeto iterativo. A única exceção moderna que conheço são frases como "tenho dito" e "tenho concluído". Isto é verdade quer em Portugal, quer no Brasil, o que sugere que é um fenómeno antigo. Exemplos tirados do CETEMPúblico:
Os últimos anos não têm sido fáceis para Artur Jorge.
Dos lançamentos que a Lusomundo tem feito do seu catálogo Goldwin, este «Jardim Profano» é seguramente um dos mais insólitos.
O significado é diferente de foram fáceis e de fez; em ambos os casos há uma ideia de repetição, ou no mínimo de continuidade/durativa na primeira frase.
Este não é de todo o caso da forma correspondente do conjuntivo:
A: Espero que tenhas compreendido.
B: Compreendi, sim.
Adicionamente, o PPC é a forma onde é menos provável que "haver" seja usado como auxiliar. A frase:
[Q]uem não achar verdade e exactidão no que hei dito e hei de dizer, tem à mão o remédio, mostre-me a verdade[...]
É engraçada, mas dificilmente seria dita hoje em dia e a frase:
Ele há estudado muito.
Soa mais a espanhol do que a português e (talvez por isso) não vejo qualquer aspeto iterativo.
Perguntas:
- Quando é se deu a transformação?
- O que levou o português a seguir este caminho, quando no espanhol, pelo contrário, o fenómeno é até a forma composta tomar o lugar da simples na maioria das situações (em regiões como Madrid)?
- A muito forte preferência por ter estará relacionada? Em exemplos históricos, está o uso de "haver" também associado a uma ideia iterativa?
[ter].[vp*] [vk*]
em corpusdoportugues.org, século XVIII. Verás que há ocurrências do composto sem ideia de iterativa ou durativa. Exemplo: "... que entenda à vista do que me dizeis, porém juro-vos que ainda nao tenho visto coisas que me pareçam melhor ou mais dignas de ser amadas."