Haviam muitos problemas não está correto em português padrão porque, no sentido de existir, haver é impessoal transitivo; muitos problemas é portanto um complemento direto e não um sujeito de haver e não há concordância1.
Uma indicação de que muitos problemas é complemento direto é o facto de que muitos problemas pode ser substituído por um pronome clítico acusativo. Compara as seguintes frases:
Havia muitos problemas, mas agora já não os há.
Existiam muitos problemas, mas agora (eles) já não existem.
Nota que o facto de haver ser impessoal não significa que orações impessoais não tenham sujeito, simplesmente esse sujeito é expletivo e não é um argumento do verbo. Sendo o português uma língua de sujeito nulo, este sujeito não tem geralmente expressão, contrariamente ao inglês (it rains). Se ocorrer, como pode acontecer em contextos enfáticos, será sempre ele:
Ele havia muitos problemas.
Segundo a Gramática do Português da Gulbenkian (pág. 1194), este estatuto de haver como impessoal transitivo não era contudo consensual em fases anteriores da língua (e, discutivelmente, não o é também hoje em dia); por exemplo escreveu Machado de Assis:
ali haviam vários deputados que conversavam de política.
Há também dialetos em que haver concorda com o argumento (idem, pág. 133):
O verbo haver tem, em alguns dialetos, um comportamento sintático diferente daquele que tem no português-padrão; esse comportamento consiste em apresentar flexão, na 3.ª pessoa do plural, no seu emprego como verbo existencial, como mostram os exemplos (57), registados em dialetos setentrionais e nos Açores [nota de rodapé: À exceção do presente do indicativo, a flexão da 3.ª pessoa do plural deste verbo ocorre, inclusivamente, na produção de falantes do dialeto-padrão (sobretudo em haviam, houveram, haveriam).]:
(57) a. Aquelas canas grandes de pôr no feijão? Aqui não hão, não hão. (ALEPG, Cesar, Aveiro)
b. (A propósito dos caches das madressilvas): Eu já tive aqui. [...] Hão singelos e hão dobrados. (ALEPG, Cesar, Aveiro)
c. Mas também hão vacas arraianas. (ALEPG, Válega, Aveiro)
d. As forquilhas que hão por aqui... (ALEPG, Castelo de Neiva, Viana do Castelo)
e. Hão cabras que andem com ovelhas e hão cabras que andem só cabras. (ALEPG, Ponta Ruiva, Flores, Açores)
[restantes exemplos omitidos]
1 Mesmo não desempenhando muitos problemas a função de sujeito, poderia ainda existir concordância verbal com o sintagma nominal se se tratasse de uma frase copulativa (como na construção impessoal são dez horas), o que não é o caso.