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qualquer falante nativo de português já usou essa expressão, não posso falar por outro países mas arrisco dizer que no Brasil essa expressão seja a mais usada quando queremos fazer uma comparação, porém se analisarmos as palavras separadamente faz pouco sentido que "que" + "nem" se transforme em "como".

alguém sabe como isso aconteceu?

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    Você deveria dar um exemplo.
    – Lambie
    Commented Mar 12, 2022 at 0:34
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    Talvez estejas interessado na pergunta relacionada o termo "que nem" está correto?. Eu sugeri lá uma explicação para a origem, que é basicamente a mesma que a apresentada pelo Stafusa.
    – Jacinto
    Commented Mar 12, 2022 at 7:47

2 Answers 2

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As fontes que encontro todas apresentam a mesma origem: elipse de uma hipérbole, ou seja, uma comparação exagerada, com palavras omitidas. A explicação é bastante verossímil, mas vale notar que não se apresentam evidências históricas (confira, no entanto, a resposta do Jacinto).

A expressão seria usada também fora do Brasil, e seu uso (com esse sentido) remontaria pelo menos a meados do século XIX. E ela é "bom português", mas provavelmente não a melhor escolha para um texto formal.

O texto de Sérgio Rodrigues a respeito é bastante conciso e claro:

‘Que nem’ é que nem ‘como’. Mas por quê?
Por Sérgio Rodrigues Atualizado em 31 jul 2020, 00h47 - Publicado em 5 ago 2015, 11h49 Veja

“Que nem” é uma expressão informal consagrada, de uso corrente tanto no Brasil quanto em Portugal, “equivalente à conjunção comparativa como”, nas palavras do gramático Domingos Paschoal Cegalla.

O Houaiss concorda com ele (que nem todo mundo), oferecendo como exemplo a construção “surdo que nem uma porta”, isto é, “do mesmo modo que uma porta, como uma porta”. Como se vê, não há dúvida de que “que nem” exprime uma comparação de igualdade.

No entanto, fica bastante claro, quando paramos para analisar a expressão, que ela surgiu como um comparativo de superioridade. “Surdo que nem uma porta” pode ser desdobrado assim: (tão) surdo que nem uma porta (é tão surda quanto ele). Ou seja, “mais surdo do que uma porta”.

E como um comparativo de superioridade acaba se transformando, pelo uso, num indiscutível comparativo de igualdade? Pela ideia de hipérbole, é claro. Estamos falando de uma expressão enfática.

Exemplo: a frase “Meu irmão estudou a vida inteira e fala inglês que nem um nativo” contém, ao pé da letra, um patente exagero: por melhor que seja o inglês do tal sujeito, sabemos que não será superior ao de um falante nativo. Mas entendemos que é muito, muito bom.

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  • Isso foi também o que eu supus na minha reposta a esta pergunta.
    – Jacinto
    Commented Mar 12, 2022 at 7:39
  • @Jacinto Interessante. Com a presença da tua resposta àquela pergunta, penso que quase seria o caso de fechar esta aqui como duplicata.
    – stafusa
    Commented Mar 12, 2022 at 10:35
  • Dizes "quase seria", portanto queres dizer que não é? Também não me parece que seja. Eu é que na outra respondi a esta, porque achei que fazia sentido naquele contexto. De qualquer modo tenho alguma coisa a acrescentar ao que lá disse e à tua resposta.
    – Jacinto
    Commented Mar 13, 2022 at 8:58
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A visão dos linguistas Teresa Tavares (2000) e Carlos Rocha (2016) é que que nem começou por significar ’mais que’ (ou ’melhor/pior que’). Uma frase como comi que nem um abade (ditote comum em Portugal) originalmente teria subentendido algo como:

Comi que nem um abade [come tão bem]
Comi [tão bem] que nem um abade [come assim]

O significado ’mais que’ ainda aparece na Infopédia e no “verbete original” do Aulete, mas já não no “atualizado”; aparece também no Moraes Silva de 1891, o dicionário mais antigo em que encontrei a locução.

A generalidade dos exemplos mais antigos que encontrei, a partir de 1835 (ver abaixo), e os que se ouvem ainda hoje em Portugal, são deste tipo. Isto é, o que se quer dizer é que algo/alguém faz muito alguma coisa (comi que nem um abade = comi muito ou muito bem) ou que tem muito certa qualidade (magro que nem um espeto = muito magro). Portanto, interpretar que nem como ’mais que’ ou ’tanto como’ dá no mesmo: mais magro que um espeto ou tão magro como um espeto são duas maneiras exageradas de dizer que ele é muito magro. Isto facilitou a transição semântica de ’mais que’ para ’tanto como’.

Entretanto surgiram no Brasil usos como “o teclado se toca que nem piano” (exemplo apresentado por um brasileiro no artigo do Carlos Rocha). Aqui já não é possível compreender o nem que subentendendo algo como no exemplo do abade: não se quer dizer o teclado se toca que nem piano [se toca assim], nem isto faria sentido; aqui o significado de que nem não é ’mais que’ nem ’tanto como’, mas sim simplesmente ’como, parecido com, da mesma maneira que’.

No exemplos mais antigos que encontrei (indico ano da primeira edição), a interpretação ’mais que’ ou ’tanto como’ (ou ’melhor que’ ou ’tão alguma coisa como’) é geralmente possível, o que nos permite subentender algo para completar o sentido, como indico entre colchetes nos primeiros exemplos:

fallava o Arabe e Grego quem nem um papagaio (O Ecco, 1835; = que nem um papagaio fala assim, não sei se tanto ou se sem tino)

fallava que nem um livro (Alexandre Herculano, 1844; = que nem um livro [fala tanto])

levo uma vida que nem um cão (Feliciano Castilho, 1845; = que nem um cão [leva vida assim])

chorava que nem uma creança (Sebastião de Sá, 1848; = que nem um criança [chora tanto])

Sonhando que nem um rei (Jardim Litterario, 1849)

Vociferando, agora, que nem um Graccho, e esgrimindo, logo, que nem um Arunte? (Anónimo, 1851)

assanhado quem nem um gato bravo (Bem Publico, 1860)

gostava d’aquellas peras rijas, que nem pedras! (Júlio Dinis, 1867)

sisuda e séria que nem uma abbadessa de convento (Júlio Dinis, 1867)

Alegrou-se que nem gato com bogalho (Molliere traduzido, 1871)

calado que nem um rato (Dicionário de francês-português, 1874)

gorda que nem um texugo […] magra que nem um espeto (Amédée Achard traduzido, 1877)

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  • Ótima busca de referências antigas!
    – stafusa
    Commented Mar 14, 2022 at 9:40

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