As tuas frases estão corretas. Temos um exemplo com a mesma estrutura na Gramática do Português da Gulbenkian (Lisboa, 2013, tomo II, p. 1889; formatação minha):
E houve muita gente que ficou e ele provavelmente ficou contente que tivessem ficado.
O trecho a negrito é perfeitamente paralelo às tuas frases:
Fiquei [feliz que tivessem vindo]
Fico [feliz que tenham vindo]
Aplicando a análise da Gramática do Português (p. 1875-7) à última frase, por exemplo,
o que nós temos é um sintagma adjetival — feliz que tenham vindo — constituído por um núcleo, feliz, e pelo seu complemento: a oração completiva oracional finita que tenham vindo; diz-se completiva porque completa o sentido de feliz; não se afirma que a pessoa está feliz em geral; simplesmente que ela está feliz com a vinda deles.
Há nestas frases duas coisas corretas mas que poderão gerar estranheza, e que vale por isso a pena esclarecer.
Possível preposição suprimida em feliz (?) que tenham vindo
Os complementos de adjetivos são normalmente introduzidos por uma preposição. A Gramática do Português (p. 1874) explica que a preposição é obrigatória quando o complemento é uma expressão nominal (como feijoada) ou uma oração infinitiva (comer uma feijoada):
Estamos todos [desejosos de feijoada]
Estamos todos [desejosos de comer uma feijoada]
Mas a preposição é frequentemente opcional quando o complemento é uma oração finita. Exemplos da Gramática (p. 1873 e 1877) em que a preposição entre parênteses é opcional:
Estamos todos [desejosos (de) que esta semana passe depressa]
Eles estão [ansiosos (por) que ela chegue]
Então põe-se a questão: qual é a preposição opcional suprimida nas nossas frases? E aqui há uma coisa curiosa. Normalmente um adjetivo usa a mesma preposição com qualquer tipo de complemento, como se vê acima no caso de desejoso, em que a preposição é sempre de. Mas com os adjetivos feliz, contente e satisfeito, a preposição varia com o tipo de complemento:
- com complementos nominais, preferem a preposição com (feliz com a chegada do filho);
- com orações infinitivas, preferem por (feliz por o filho ter chegado; no passado também se encontra de o filho ter chegado);
- e com orações finitas, quando usa preposição, é de, como neste exemplo do dicionário de Moraes Silva (1890) “contente de que [a vontade de Deus] se faça” ou neste mais recente do Pe. Omar (2012), “fico feliz de que sejamos […]”. No entanto de longe o mais comum, com orações finitas, é não usar preposição nenhuma. Andei a vasculhar o Google Books, e esta preferência parece vir pelo menos já do século XV, como nestes exemplos de Fernão Lopes (1385 – 1460), “contente que ele fosse um deles” e do Padre António Vieira (1608 – 97) “contente que […] se queime”.
Uso do conjuntivo/subjuntivo
Nas tuas frases, o verbo do complemento oracional finito está no conjuntivo (termo preferido em Portugal) ou subjuntivo (preferido no Brasil): que tenham vindo (pretérito perfeito), que tivessem vindo (pretérito mais-que-perfeito). No entanto referem um evento real: a frase, por exemplo, fiquei feliz que tivessem vido implica que eles realmente vieram. Isto poderá causar uma certa estranheza, porque conjuntivo está normalmente associado ao incerto, potencial, hipotético.
Mas este uso do conjuntivo está correto. Explica a Gramática do Português (p. 1841-2) que nos complementos oracionais finitos o indicativo só se usa para transmitir uma atitude de conhecimento (sei que ele chegou, estou certo (de) que ele chegou). Para outras atitudes usa-se o conjuntivo. Nomeadamente, e passo a citar:
De uma forma geral, selecionam o conjuntivo no verbo da oração subordinada:
[…]
(iii) Os predicadores que expressam uma atitude de avaliação perante um dado estado de coisas, como os verbos detestar, gostar (de), lamentar, suportar e tolerar, entre outros; lexias verbais achar bem/mal, o nome pena, os adjetivos agradável, bom, insuportável, lamentável e triste, entre muitos outros, como se ilustra a seguir:
(82) a. Lamento/Detesto [que o João tenha decidido sair do país].
b. É triste [que eles se comportem dessa forma].
Apesar de, tipicamente, o modo conjuntivo estar associado ao domínio do incerto ou do hipotético, não existe uma relação direta entre conjuntivo e “não realidade”. Com efeito, os predicadores avaliativos, como lamentar ou triste, permitem inferir a verdade da proposição expressa no complemento; porém não selecionam o indicativo (cf. eu lamento que a Maria tenha visto o filme, frase na qual o uso do verbo lamentar como predicador da oração principal permite inferir a verdade da proposição ‘a Maria viu o filme’; cf. 36.4). Este facto deve-se ao tipo de modalidade envolvida, que não é epistémica e sim avaliativa.
Também em fico feliz que tenham vindo, a atitude não é epistémica mas sim avaliativa; é o mesmo tipo de atitude que em gostei que tivessem vindo, por exemplo, em que gostar (de), como diz a Gramática, exige o conjuntivo no complemento oracional.