A expressão mala e cuia é quase certamente de origem brasileira; o significado que referes (mudar-se definitivamente) parece ainda ser relativamente recente — uma edição da revista municipal de São Paulo, que o Google Books data de 1937 (mas que possivelmente é anterior) define viajar de mala e cuia como viajar sem bagagem. A referência mais antiga no Google Books é 1924, num guia que refere existir uma cadeia de restaurantes de comida mineira com esse nome. Só na década de 1960 começam a surgir ocorrências da expressão cujo valor é inequivocamente (mudar-se) de forma definitiva, ainda a par do significado sem bagagem.
A Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, publicada entre 1936 e 1960 e bastante exaustiva, também não refere esta expressão. A entrada para cuia lê:
s. f. Fruto da cuieira (v.), com cuja casca de fazem vasilhas do mesmo nome e aplicadas a vários misters: «voltou logo trazendo pães, postas de peixe frito e uma cuia com farinha», Franklin Távora, O Cabeleira, cap. 11, p. 155. ◆ Vasilha de feitio e usos semelhantes: chama-se cuia no Rio-Grande-do-Sul ao recipiente em que se prepara e toma o mate. ◆ Espécie de almofada de cabelo postiço com que as senhoras enfeitavam a nunca e as costas: «no toutiço dentro da rêde a cuia, figurando uma trança enrolada, caída até às costas», Ricardo Jorge, Canhenho dum Vagamundo, p. 204. ◆ Bras. O mesmo que cuité. ◆ Bras. de Pernamb. Medida de capacidade para secos equivalente a 1/32 de alqueire. (Cf. Rodolfo Garcia, Dic. de Brasileirismos, s. v.). ◆ Bras. Gír. Cabeça. Levar, apanhar na cuia, apanhar pancada ficar vencido. Meter a cuia, dar cabeçadas. Banzé de cuia, conflito, confusão, rôlo. (Cf. Raúl Pederneiras, Geringonça Carioca, s. v.). ◆ Prato da balança. ◆ Prov. beir. e trasm. O mesmo que cu.
BOT. Fruto da cuieira (v.). ◆ Cuia de macaco : Nome vulgar brasileiro da Couroupita lentula Miers. e da C. subsessilis Pilg., árvores da família das lecitidóideas, a segunda também designada no Pará castanha de macaco. ◆ Cuia do brejo : Designação brasileira do Styrax camporum Pohl, árvore da família das estiracáceas, boa para arruamentos e que produz uma resina semelhante ao benjoim. Possui também os nomes de canela poca, estoraque do campo e pinduíba.
O significado de cuia como fruto da cuieira não está naturalmente limitado ao Brasil, mas a árvore é nativa da América do Sul, pelo que o seu uso em Portugal tenderá a ser limitado. O significado como vasilha também não tem essa anotação na Grande Enciclopédia, mas tem-no no Priberam — e eu também não encontro exemplos desse uso em Portugal. Ricardo d'Almeida Jorge é um autor português, mas a aceção de cuia em que é citado não parece ter qualquer relação com fruto da cuieira/vasilha.
Dito isto, é verdade que a expressão de mala e cuia, com o seu significado moderno, aparece em alguns textos portugueses. Por exemplo, também aqui:
Talvez a moça não perceba que; antes de se mudar para cá de mala e cuia, já Portugal andava pelas "bocas do mundo", salvo seja, no melhorzinho que as línguas têm para dizer, sobre este belo jardim.
Mas trata-se certamente de importação da expressão brasileira, que será compreendida por uma fração dos portugueses.
Pode vir de mala e cuia, amor / Que eu não vou tá nem aí pro povo