A formação da sílaba /zi/ pelo encadeamento das palavras faz e isso é um exemplo de um fenómeno típico da fala encadeada e mais ou menos universal na língua portuguesa, e a inserção de [j] na palavra “faz” pertence a um tipo de epêntese típica de alguns falantes brasileiros, mas não dos portugueses.
Fala Encadeada
O encadeamento de palavras é conhecido em inglês por connected speech, e aparece como fala encadeada em vários textos em português. De acordo com a Wikipedia inglesa, fala encadeada (“connected speech”) é “em linguística uma sequência contínua de sons formando locuções ou conversas na língua falada.” Explica ainda que na fala encadeada vários sons são modificados de modo que muitas palavras soam diferentes das mesma palavras pronunciadas isoladamente.
Seara, Nunes e Lazzaroto-Volcão (Fonética e fonologia do português brasileiro, UFSC, Florianópolis, 2011, p. 98) mostram esta alteração de sons em ação na palavra lápis, alteração essa em tudo idêntica ao que acontece com faz (as letras s e z representam exatamente os mesmos sons em fim de palavra). Do encadeamento de lápis e amarelo resulta a nova sílaba /za/:

Se lápis for seguido de vogal na palavra seguinte, o s é realizado como [z] (como em caso ou razão) por toda a gente; se for seguido das consoantes surdas /k, f, p/ ou /t/ é realizado como [ʃ] (chá) por quem chia o s e como [s] (caça, passo) por quem não chia; se for seguido das consoantes sonoras /b, g, l, m, n/ ou /v/ é realizado como [ʒ] (jarro) por quem chia o s e como [z] por quem não chia.
No princípio ou meio da palavra, estes quatro fonemas—[s], [z], [ʃ] e [ʒ]—identificam palavras diferentes, como por exemplo [s]arro, [z]arro, [ʃ]arro e [ʒ]arro, que se distinguem apenas pelo fonema inicial. Mas em fim de palavra, o falante ignora a diferença entre quaisquer destes quatros sons (se a chegar a notar): na fala encadeada, um daqueles quatro sons é selecionado automática e inconscientemente simplesmente em virtude do som que se segue (e do dialeto). Por isso se diz que em final de palavra estes quatros sons compõem um único arquifonema, representado por /S/.
Não encontrei nenhum termo para a formação de sílaba do /S/ com a vogal inicial da palavra seguinte. Talvez por ser uma coisa corriqueira no português: quando uma consoante faz contacto com uma vogal seguinte, naturalmente forma sílaba com ela. A modificação do som do arquifonema /S/ em função do som seguinte é um caso de assimilação parcial regressiva. O /S/ torna-se mais semelhante ao som seguinte (assimilação); a influência vai do som seguinte para o anterior (regressivo); e o /S/ meramente adquire traços (sonoro ou surdo) do som seguinte (assimilação parcial), em vez de se lhe tornar igual (o que seria assimilação total). Podem ver a terminologia nesta página do Prof. Paulo Hernandes).
Epêntese
A epêntese é em geral a inserção de um fonema extra numa palavra. Um caso comum no português brasileiro é a inserção da vogal [i] entre duas consoantes, criando uma nova sílaba, como em ritmo → rit[i]mo, advogado → ad[i]vogado. Isto parece resultar de uma aversão a certos encontros consonantais, como tm, gn, dv, pt, etc. Esta aversão vem da origem da língua, mas entretanto os portugueses perderam-na.
O nosso caso particular de epêntese vem descrito na Fonética e fonologia do português brasileiro (p. 115), por Cantoni (“A epêntese no português brasileiro…”, Gragoatá, Niterói, n. 38, p. 231-246, 2015; p. 233), e é estudado, só para o caso do s não chiado, por Peixoto (“Características acústicas do processo de epêntese do glide [j] diante de [s] não-palatalizado” Revista do GEL, São Paulo, v. 8, n. 1, p. 156-171, 2011). Em qualquer destas publicações, chamam-lhe apenas epêntese. Consiste da inserção da semivogal [j] (como em pai, hiato ou área) em sílaba tónica final terminada pelo arquifonema /S/ (na prática, palavras oxítonas terminadas pelas letras s ou z). O [j] é inserido antes do /S/, fazendo ditongo com a vogal anterior, como por exemplo (links ao Forvo, onde podem escutar estas pronúncias):
rapaz → rapa[j]z, paz → pa[j]z
três → trê[j]s, dez → de[j]z
arroz → arro[j]z, voz → vo[j]z
luz → lu[j]z
Quanto à preponderância deste tipo de epêntese, Cantoni (p. 233) diz apenas que ocorre em “alguns dialetos” e que o fenómeno “é marcadamente sujeito a variação dialetal”. Peixoto (p. 156) indica apenas o interior do estado de São Paulo como um exemplo onde esta epêntese ocorre.