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As vezes fico confuso com a flexão de substantivos compostos. A seguir alguns exemplos:

Exemplo (1):
Cavalo-vapor / para-lama
Cavalos-vapor / para-lamas

Exemplo (2):
Decreto-lei / matéria-prima
Decretos-leis / matérias-primas

Exemplo (3):
Salvo-conduto / vice-diretor
Salvos-condutos / vice-diretores

Exemplo (4):
Surdo-mudo / bem-falante
Surdos-mudos / bem-falantes

Os exemplos são de Fernando Moura, Gramática aplicada ao texto, Vestacon: Brasilia-DF, 2005, e usados em comentários sobre uma questão de concurso da Universidade de Brasília: UnB.

Qual é a regra que foi utilizada para flexionar ou não os elementos desses substantivos?

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  • 1
    Não seria melhor indicar a fonte dos exemplos?
    – Jacinto
    Aug 11, 2016 at 12:23
  • Sim, editei a pergunta. Aug 11, 2016 at 13:22
  • Salvo-conduto parece violar a "regra". Quando há um adjetivo, só o substantivo fica no plural. Bem-falente, por ex., é um adjetivo e um substantivo. Então no plural, bem-falantes. Igual que para-lamas. Ë um verbo (parar) que funciona como adjetivo. Em francês, esse salvo-conduto, não fica salvos-condutos (sauf-conduites). Nem vejo a razão do s em português. Salvo é adjetivo. Seguindo a regra, deveria ser: salvo-condutos. Então não sei responder bem....Parece que os dois se admitem....
    – Lambie
    Aug 11, 2016 at 22:50
  • @Lambie "bem-falante" me parece ser um advérbio e um adjetivo. "Ele é um indivíduo bem-falante" "Ele é muito falante".
    – Centaurus
    Aug 13, 2016 at 0:51
  • @Centaurus falante: utilizador de uma língua ou locutor. O bem é adjetivo. Um cavalo falante, o que fala, o falante é adjetivo....
    – Lambie
    Aug 13, 2016 at 14:05

1 Answer 1

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+50

«Não é fácil a formação do plural dos substantivos compostos» — é como Celso Cunha e Lindley Cintra abrem a exposição do assunto na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Lisboa, 2014, p. 248-50). E este artigo no Ciberdúvidas diz que o assunto é «por vezes, complicado e um tanto controverso». Mas lá apresentam algumas regularidades. O que se segue baseia-se sobretudo no Cunha e Cintra. Confirmei a correção de todos os exemplos no Vocabulário Ortográfico Comum.

Verbo + substantivo. O verbo não se altera, e só o segundo elemento é que passa para o plural:

guarda-chuva, guarda-chuvas
pica-pau, pica-paus
para-sol, para-sóis

Está também neste caso o para-lama, para-lamas. Com uma observação: podemos também usar para-lamas como substantivo singular: um para-lamas. Isto é comum com este tipo de substantivos. Mais exemplos de substantivos de dois números: abre-latas, saca-rolhas, quebra-nozes, para-raios.

Advérbio, prefixo ou elemento que funcione como prefixo + substantivo ou adjetivo. Advérbios e prefixos são invariáveis, portanto só o segundo elemento é que passa para o plural. Caiem neste caso os teus exemplos vice-diretor e bem-falante. Outros exemplos:

abaixo-assinado, abaixo-assinados
sempre-viva, sempre-vivas
pré-história, pré-histórias
arqui-inimigo, arqui-inimigos

Adjetivo e Substantivo. Normalmente os dois elementos passam ao plural. É o caso do teu exemplo matéria-prima e salvo-conduto. Outros exemplos:

Amor-perfeito, amores-perfeitos
Gentil-homem, gentis-homens
Alto-comissário, altos-comissários

Dois substantivos. Este é o caso mais complicado. O mais comum é ambos os elementos passarem ao plural (indico apenas os plurais): surdos-mudos, tenentes-coronéis, tios-avôs Mas há uma exceção: só o primeiro elemento passa ao plural quando o segundo substantivo «funciona como determinante específico» (Cunha e Cintra, p. 249). Por exemplo, livro-caixa, livros-caixa. O livro-caixa é um livro onde se registam as entradas e saídas de dinheiro em caixa. Portanto caixa determina o tipo do livro; não se pode dizer o inverso, que livro determina o tipo de caixa; nem se pode dizer que livro-caixa seja livro e caixa ao mesmo tempo, ou uma coisa intermédia entre livro e caixa. Cunha e Cintra dão como exemplos (indico apenas o plural) navios-escola, salários-família, bananas-prata, mangas-espada; no Ciberdúvidas temos ainda cafés-concerto e livros-razão. E está neste caso o teu cavalos-vapor.

O problema é que ou esta regra não é sempre seguida ou nem sempre é claro se o segundo substantivo determina o tipo do primeiro. E alguns exemplos dados pelo Cunha e Cintra e artigo do Ciberdúvidas como pertencendo a esta categoria aparecem no Vocabulário Ortográfico Comum (navio-escola) e em vários dicionários com dois plurais possíveis:

Navio escola: navios-escola ou navios-escolas
Café-concerto: cafés-concerto ou cafés-concertos

Também decreto-lei, contrariamente à opinião do Fernando Moura, admite os plurais decretos-lei e decretos-leis. Alguns casos onde há consenso que apensas o primeiro exemplo passa ao plural: livros-caixa, livros-razão, cavalos-vapor, anos-luz, banana-prata.

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