
Eu cresci e vivi na região de Lisboa, entre Torres Vedras e Setúbal, e aqui foi sempre frigideira que ouvi. Que no Porto se diz sertã é fácil ver na net. Veja-se este artigo no jornal Público (2012) sobre uma Susana que se mudou de Cascais, ao pé de Lisboa, para o Porto (grafia original, ênfase minha):
O sotaque lisboeta ainda se percebe em Susana e as expressões que usa no dia-a-dia (excepção para o fino) são sempre as lisboetas [...] diz cadeado (aloquete), saltos (tacões), atacadores (cordões), frigideira (sertã), refogado (estrugido), sopra as velas (bufa) e chama gulosos (lambareiros) aos filhos.
Este Breve dicionário tripeiro-alfacinha (portuense-lisboeta) “traduz” também sertã para frigideira, e sertã aparece também como termo nortenho neste artigo da Wikipédia sobre regionalismos.
Existe também a vila da Sertã, perto do centro geográfico de Portugal, e que indiquei no mapa, e uma lenda, também mencionada no dicionário Houaiss, segundo a qual uma mulher defendeu o castelo da vila atirando aos atacantes uma sertã com azeite a ferver. Este antigo brazão da vila parece celebrar esta lenda. Isto mostra que palavra também já foi usada por ali.
Há vários exemplos destas divisões lexicais entre norte e sul, mas a fronteira varia de caso para caso. Lindley Cintra apresenta no artigo Áreas Lexicais no Território Português oito casos ilustrados em mapas. Por exemplo (mapa 5), diz-se anho no noroeste, cordeiro numa faixa do nordeste ao litoral centro, e borrego mais a sul.
Sartã é uma mera variação de sertã. Neste Corpus do Português encontramos as duas formas dos séculos XV ao XVII, mas sertã é a mais frequente (13 contra 4 ocorrências). No Corpus do Português, a partir do século XIX (não há ocorrências no século XVIII) só encontramos sertã, mas no Google Books ainda encontramos algumas sartãs recentes. Também encontramos as duas formas para o nome da vila.
Esta variabilidade de formas era natural no passado, em que havia pouca comunicação entre regiões. Na aldeia onde cresci, ainda ouvi pessoas mais velhas dizerem Taresa e Sabastião. E encontramos Sabastião no Corpus do Português até ao século XVII, em menor frequência que Sebastião. Taresa não encontramos, mas Tareja, sim, tal como Arnesto. Frequentemente, quando existem duas variantes, uma adquire mais prestígio, e a outra acaba por desaparecer. O que é interessante é que sartã tenha sobrevivido até aos dias de hoje.