O argumento para inicial maiúscula é internet ser o nome de uma entidade única, mas isto vai tendo cada vez menos peso, e quer em português quer em inglês a tendência crescente é escrever com minúscula.
Internet é uma redução de internetwork, que por por sua vez é formada pelo pseudoprefixo inter- (‘entre’) e network (‘rede (de ligações)’, como em road network, ‘rede de estradas’). Ver por exemplo Etymonline ou o dicionário Houaiss, que traduz internetwork como ‘ligação entre redes’. A questão se a palavra é um nome próprio, Internet, ou nome comum, internet, coloca-se quer no português quer no inglês, e em inglês existem pilhas de artigos a discutir o assunto. Este blogue do Oxford Dictionaries (5-4-2016) faz uma boa síntese do percurso da palavra (minha tradução):
Na verdade, os primeiros usos da palavra, presente no Oxford English Dictionary desde 1974, foram com i minúsculo. Inicialmente havia muitas internetes—a palavra era usada para referir qualquer rede de computadores contendo ou ligando várias redes mais pequenas; mais tarde passou especificamente a referir a rede global que conhecemos hoje, que foi distinguida como “a Internet”, por oposição a “uma internet”. Não é incomum palavras assumirem uma forma com letra maiúscula num sentido particular visto como nome próprio (por exemplo, os norte-americanos chamam ao documento fundacional do seu governo federal “a Constituição”); no entanto, no caso de “a Internet”, por meados do anos noventa, a necessidade original de desambiguação estava em grande medida obsoleta, e a alguns escritores e editores a convenção da inicial maiúscula apresentava-se desnecessária, ultrapassada e inestética.
Este “Should We Be Capitalizing the Word ‘Internet’” publicado na revista de tecnologia Wired (19-10-2015), explica a razão de a distinção entre a Internet e uma internet já não ser necessária (minha tradução):
A razão normalmente avançada para esta mudança no uso é que a internet e a web estão através do uso comum a passar de substantivos próprios—entidades únicas, com nomes—a substantivos genéricos. Com efeito, a maioria das pessoas (com a exceção dos ‘techies’) não sabem de nenhumas internetes para além da Internet—essa distinção deixou de ser relevante no uso corrente. E para muita gente mais nova que cresceu com a tecnologia, a internet é uma coisa banal—simplesmente mais um meio de comunicação, como o telefone, televisão e rádio.
Entretanto no inglês, the internet tem vindo a ganhar terreno a the Internet, embora em Abril de 2016, no vasto corpus reunido pelo Oxford Dictionaries (ver blogue), Internet ainda vencesse por 54% contra 46%. Isto deve-se à América do Norte; no Reino Unido vencia internet por 75% contra 25%. Mas as coisas estão a mudar, e entretanto instituições norte-americanas de peso como a Associated Press e o New York Times (ver artigo no NYT) decidiram passar a escrever internet, com minúscula.
Em português creio que a preferência por minúscula é ainda mais forte. Os dicionários são normalmente conservadores, mas já em 2003 a edição portuguesa do Houaiss dizia apenas “inicial por vezes maiúscula”; o dicionário da Academia de Ciências de Lisboa de 2001 traz apenas a grafia com minúscula; o Aulete diz “muitas vezes, com inicial maiúscula” e no artigo enciclopédico escreve sempre com minúscula; a Infopédia diz, sem se comprometer para um lado ou para outro, “também com maiúscula”.
Note-se que coexistirem os dois entendimentos, nome próprio com maiúscula versus nome comum com minúscula, não é exclusivo de internet. O dicionário Houaiss (Lisboa, 2003) diz que universo na aceção ‘conjunto de todas as coisas que existem ou se crê existirem’ se escreve por vezes com inicial maiúscula; o “por vezes” indica que mais normalmente se escreve com minúscula.