Sim, a construção "ir + Infinitivo" como tempo futuro é correta e presente em obras de referência já há algum tempo, como outras respostas já colocam. Mas também é verdade que ainda existe resistência ao seu uso por parte de alguns gramáticos e falantes — e a perspectiva histórica ajuda a entender o porquê:
Já em 1822, Barbosa registrava em sua Grammatica philosophica da lingua portugueza (pg. 197) o verbo "ir" como auxiliar (negrito meu):
Taes são os nossos tres verbos [auxiliares] de movimento Andar, Vir, e Hir, que junctos com os infinitos, e participios de outros verbos deste modo: Ando ou Vou escrevendo, Venho de escrever, Vou escrever; o primeiro exprime hum movimento reiterado e frequente da acção, e corresponde aos verbos frequentativos Latinos; o segundo hum preterito proximo; e o terceiro hum futuro proximo, correspondentes aos aoristos e futuros proximos dos Gregos.
Contudo, "ir" foi por muito tempo, em conjunção com outros verbos, usado majoritariamente ainda em seu sentido pleno (= "lexical"), i.e., com sentido de movimento — em oposição a construções em que ele é "esvaziado semanticamente" e adquire um caráter apenas auxiliar (= "gramatical"). Como Lara coloca em sua dissertação:
não podemos esquecer que, no século XIV, verbos que hoje em dia
compõem perífrases tinham apenas sentido pleno. Ao se dizer, por exemplo, O rei vai a lutar
em Castela, o verbo ir tinha sentido de locomoção, de deslocamento no espaço.
E, embora existam exemplos antigos do "ir" auxiliar (Gonçalves, Strogenski, et al):
- "e vai lavar camisas" — Cantigas de amigo de D. Dinis, século XIII
- "per que se uay hindo [=vai indo] de mal e pior" — Orto do Esposo, séc. XIV
- "[o homem] sempre vai buscar a terra" — Sermão da Sexagésima, Pe. Antônio Vieira, séc. XVII
- "Agora é que ele vai namorar deveras" — Dom Casmurro, Machado de Assis, séc. XIX
o "ir" ao menos parcialmente lexical se mantém dominante até o século XIX, como exemplificado por uma análise de peças teatrais brasileiras, que mostra que o futuro auxiliado pelo "ir" suplantaria o futuro simples apenas no século XX.
Essa tendência, contudo, se acelera no século XXI e é particularmente notável no português falado contemporâneo, com uma análise (tab. 10) de registros orais recentes revelando seu uso em 98%(!) das ocorrências de futuro.
Ou seja, o processo pelo qual "ir" adquiriu seu sentido de auxiliar de futuro foi gradual mas, crucialmente, sua adoção vem se acelerando nas últimas décadas, explicando em parte a resistência que ainda existe à forma.
Outras razões prováveis para a resistência incluem o preconceito de classe (Lara, pg. 28) e o ensino limitado das escolas brasileiras, como lembra o professor Pasquale Cipro Neto:
[o que muitas vezes se aprende na escola] não deixa de ser verdadeiro, mas é apenas parte da história.