A tua frase não está errada, mas é provável que a ordem ‘normal’ sujeito-verbo seja aí mais natural. Só poderia dar uma opinião mais inequívoca se visse a frase completa.
Vou limitar-me a analisar os exemplos do Aluísio Azevedo, tentar encontrar padrões, para no fim discutir a tua frase. Este assunto daria pano para mangas, e eu não conseguiria compor aqui um guia minimamente completo da ordem verbo-sujeito. E noutro lado, provavelmente também não.
No primeiro exemplo do autor,
De um casebre miserável, de porta e janela, (1) ouviam-se gemer os armadores enferrujados…
temos dois verbos antes de armadores. Para os estudar separadamente, consideremos primeiro esta frase equivalente (mas menos bem-sonante):
De um casebre miserável, de porta e janela, (1a) ouviam-se os armadores enferrujados gemer
A frase (1a) está na voz passiva sintética, e aí a norma é a ordem verbo-sujeito paciente, ouviam-se os armadores. Até porque os armadores ouviam-se gemer confunde-se com a voz ativa: os armadores ouviam-se a si mesmos. Na voz ativa a frase seria alguém ouvia os armadores enferrujados gemer (sujeito agente-verbo) e na passiva analítica seria os armadores enferrujados eram ouvidos gemendo/a gemer (neste caso a sintética soa muito melhor que a analítica). Na voz passiva analítica é mais comum a ordem sujeito paciente-verbo, embora a inversa seja possível (todas as vítimas foram socorridas/foram socorridas todas as vítimas)
Agora, a diferença entre (1a) ouviam-se os armadores gemer e (1) ouviam-se gemer os armadores. O primeiro elemento ganha ênfase. Em (1a) estamos mais interessados nos armadores, por que razão estarão eles a gemer; em (1) estamos mais interessados no gemer em si, e na maneira como o gemer contribui para a atmosfera geral. Isso passa-se também na voz ativa, como no segundo exemplo, chilreava um sabiá. Não conheço O Mulato, mas diria que o autor está a descrever o ambiente: o foco está mais no chilrear e gemer que se ouve do que no agente que chilreia ou que geme. Do mesmo modo, eu poderia dizer ao descrever um ambiente:
(a) Da minha janela eu via passar os carros, brincar os miúdos, cair a chuva, cumprimentarem-se os amigos.
(b) Na praça era uma alegria: corria a garotada, namoriscavam os adolescentes, conversavam os mais velhos.
Esta inversão da ordem mais normal é frequentemente usada para ‘montar a cena’ para a ação principal:
(c) Estava eu mergulhado nos meus pensamentos, quando de repente ele me apareceu à frente.
(d) Ia o João muito bem a caminho da escola, e cai-lhe um pombo morto em cima da cabeça.
Em (d) há uma segunda inversão. O verbo cair ganha ênfase ao ser adiantado: nós não queremos saber do pombo morto; a queda dele na cabeça do João é que é importante. Outros exemplos de inversão em que identidade do sujeito não é importante:
(e) Foi cá um temporal: tombaram duas árvores na minha rua e voaram muitas telhas com a ventania.
(f) Deram à costa vários destroços do navio naufragado. Sobreviveram apenas cinco pessoas.
No terceiro exemplo, faz preguiça estar aqui, o núcleo do sujeito é um verbo, estar. A inversão soa muito bem com este tipo de sujeitos:
(g) Fazia dó ver tanta miséria. Custou-me muito aguentar aquilo.
(h) Não é assim tão caro fazer uma alimentação saudável.
No último exemplo, e, quando chegava a ocasião de ceder a fazenda, mais uma vez está-se a ‘montar a cena’ para a ação principal. Mas há ainda outra coisa: verbos qeu indicam aparecimento e desaparecimento parecem prestar-se particularmente à inversão, mesmo quando descrevem a ação principal, como de (l) a (n):
(i) Quando chegavam os meus primos, então é que era uma festa.
(j) Quando começaram a cair os primeiros flocos de neve, a garotada veio toda para a rua.
(k) Quando apareceram os primeiros computadores pessoais, ninguém imaginou a revolução que iria acontecer.
(l) Desapareceu de casa dos seus pais Fulano de 17 anos de idade etc. (Forma padrão de publicitar o desaparecimento de uma pessoa em Portugal.)
(m)Apareceu-me uma mancha no pescoço.
(n) Chegaram os teus primos agora mesmo.
Só depois de elaborar esta teoriazita da inversão da ordem normal sujeito-verbo é que consegui completar a tua frase, com saiu o rapaz, satisfatoriamente. Portanto, como o verbo ganha ênfase em detrimento do sujeito ao ser puxado para a frente, temos que encontrar um contexto em que isso se justifique. Portanto aqui ficam duas frases, uma em que o rapaz saiu se impõe, outra em que saiu o rapaz soa bem.
(o) Nesse mesmo dia, depois de ela se afastar, o rapaz saiu para campo e só regressou a casa um semana mais tarde.
(p) Nesse mesmo dia, depois de ela se afastar, saiu o rapaz para campo, e foi logo de seguida que os ladrões entraram em casa.