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Na bíblia, em Filipenses 2:8, temos o seguinte versículo:

E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz.

Filipenses 2:8

Eu destaquei a parte que me chamou atenção de negrito. É que, nos dias atuais, seria motivo de muita chacota se você ouvisse alguém dizendo "ele humilhou-se a si mesmo". Alguém poderia dizer que tal pessoa cometeu um erro, uma redundância.

Mas eu gostaria de saber se isso realmente é uma redundância de acordo com as regras gramaticais, ou se simplesmente tem algum sentido usar "a si mesmo" depois da palavra "humilhou-se" (estou desconsiderando interpretações teológicas).

A frase correta não seria: humilhou a si mesmo ou simplesmente humilhou-se?

Atualização:

Encontrei outros versículos que contém o mesmo exemplo da aparente redundância, apenas para reforçar que a forma de escrita não foi usada apenas no versículo acima:

Porque não é aprovado quem a si mesmo se louva, mas, sim, aquele a quem o Senhor louva. 2 Coríntios 10:18


Porque não ousamos classificar-nos, ou comparar-nos com alguns, que se louvam a si mesmos; mas estes que se medem a si mesmos, e se comparam consigo mesmos, estão sem entendimento. 2 Coríntios 10:12

Nota: Versículos acima foram retirados da Bíblia Almeida Corrigida e Revisada Fiel

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  • 1
    Sabes, o pessoal gosta muito de passar sentença. Depois apanha umas manias e repete-as acriticamente, como que todo o pleonasmo é vício. O pleonasmo é figura de estilo; só é vício se empregue à toa. Encontra-se essa construção na melhor literatura em língua portuguesa: desprezar-se a si mesmo (Erico Veríssimo, 1961) >>
    – Jacinto
    Commented Jul 10, 2017 at 18:58
  • 1
    >> via-se a si mesmo (Machado de Assis), examinou-se a si mesmo (José Saramago, 1989); devorava-se a si mesmo (Alexandre Herculano)
    – Jacinto
    Commented Jul 10, 2017 at 19:02
  • 1
    A vulgata (tradução latina da bíblia) usa, nos trechos que citaste, a expressão se ipsum(a) + VERBO (isto é, a si mesmo(a) se + VERBO), que também pode ser considerada como pleonasmo, pois usar apenas o pronome reflexivo se já seria suficiente. Em Coríntios II 10:18 usa-se ainda o pronome composto seipse, formado pela união daqueles. Creio que a escolha de a si mesmo se louva em 10:18 na tradução portuguesa é de caráter semântico (tal como respondido por Artefacto) e remete à escolha de seipsum commendat na tradução vulgata.
    – Seninha
    Commented Jul 11, 2017 at 1:31
  • 1
    PS: ipsum(a) = a si mesmo(a), e commendare = louvar. Mas a minha bíblia traduz "commendare" como "recomendar", que seria a tradução literal e etimologicamente fiel.
    – Seninha
    Commented Jul 11, 2017 at 15:36
  • não seria o "se" partícula apassivadora "ele foi humilhado por si mesmo"? Commented Jul 13, 2017 at 14:42

2 Answers 2

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Não há nada de extraordinário nessas frases. Pessoalmente, creio que ficam melhor com o reforço a si mesmo dada a infrequência do uso reflexivo dos verbos em questão ou da necessidade de contraste (em 2 Coríntios 10:18)

O análise tradicional é a de que se é pronome reflexo e expressão anafórica cujo valor referencial está ligado ao do sujeito (geralmente) e que si mesmo/próprio é um reforço do reflexo. Aliás, a possibilidade de existir reforço com mesmo/próprio é um teste usado para determinar a reflexividade de se (cf. *ele admira-se a si mesmo com o estado da situação, onde se é inerente ou pseudo-reflexo).

Nalguns casos, o reforço pode ser necessário para fazer a desambiguação entre a leitura reflexa e a leitura recíproca: (eles louvaram-se a si mesmos vs. eles louvaram-se uns aos outros).

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  • 3
    Também para forçar uma leitura reflexa em vez de inerente: convencer-se a si mesmo, enganar-se a si mesmo, magoar-se a si mesmo.
    – Jacinto
    Commented Jul 10, 2017 at 18:34
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Existem dois tipos de pleonasmo: o pleonasmo vicioso e o pleonasmo literário.

O Pleonasmo Vicioso, também chamado de redundância, é um vício de linguagem. É um erro sintático não intencional que a pessoa comete por desconhecimento das normas gramaticais.

Exemplos: "Subir para cima": o verbo “subir” já indica ir para cima, elevar-se. "Descer para baixo": o verbo “descer” já denota mover de cima para baixo, declinar. "Entrar para dentro": o verbo “entrar” já indica passar para dentro. "sair para fora": o verbo “sair” é sempre passar de dentro para fora, afastar-se.

Pleonasmo Literário Já o pleonasmo literário (ou intencional) é usado com intenção poética de oferecer maior expressividade ao texto. Assim, nesse caso ele é considerado uma figura de linguagem.

Em outras palavras, o pleonasmo literário é utilizado intencionalmente como recurso estilístico e semântico para reforçar o discurso de seu enunciador. Observe que nesse viés, o escritor tem 'licença poética' para fazer essa ligação.

Exemplos:

“E rir meu riso e derramar meu pranto” (Vinicius de Moraes) “E ali dançaram tanta dança” (Chico Buarque e Vinicius de Moraes) “Me sorri um sorriso pontual e me beija com a boca de hortelã” (Chico Buarque)

Na Bíblia, que é um livro traduzido em excelente e exemplar português altamente erudito, temos inúmeros exemplos de pleonasmo literário, construídos por meio da repetição do pronome oblíquo, gerando um pleonasmos literário de grande efeito comunicativo:

"E, achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz." (Filipenses 2:8)

"Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma deste pão, e beba deste cálice." (1Cor 11:28 - Almeida Revista e Corrigida)

"Depois disto ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem irá por nós? Então disse eu: Eis-me aqui, envia-me a mim." (Isaías 6:8 Versão Almeida Revista e Atualizada).

Espero ter ajudado.

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