Orações com o verbo no infinitivo impessoal possuem sujeito?
Por exemplo, na seguinte oração:
Querer é tudo,
Há sujeito? Se sim, qual seria ele e qual seria sua classificação?
O teu exemplo é na verdade constituído por duas orações:
Querer é tudo
Há uma oração subordinante em letra normal — “é tudo” — e em negrito temos uma oração subordinada, que é o sujeito de “é”, o verbo da oração subordinante.
Por sua vez, o verbo da oração subordinada — “querer” — está no infinitivo impessoal ou não flexionado, que normalmente não pode ter um sujeito foneticamente realizado. É isto que acontece no nosso exemplo. Vejamos o que dizem Celso Cunha e Lindley Cintra (Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, 2014, p. 606; minha formatação, com a oração subordinada em negrito; omito as abonações):
I O infinitivo conserva a forma NÃO FLEXIONADA:
1º) quando é IMPESSOAL, ou seja, quando não se refere a nenhum sujeito:
Viver é exprimir-se.
Jurar falso é grande crime.
Amar os homens é sempre uma alegria dolorosa.
O infinitivo impessoal tem no entanto um sujeito semanticamente implícito. Nos exemplos acima esse sujeito semanticamente implícito é qualquer pessoa, as pessoas em geral. Noutros casos é alguém ou algo concreto que pode ser “recuperado” do contexto. Os exemplos seguintes são da Gramática do Português da Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 2013, tomo II, p. 1942-46; minha formatação, com a oração subordinada em negrito; indico entre colchetes o sujeito implícito, que obviamente não é dito nem escrito, e em itálico o elemento que o permite “recuperar”):
Nós esquecemo-nos de [nós] comprar o pão
O professor aconselhou-te a [tu] concorrer a uma bolsa
Ocorreu-nos [nós] fazer uma pergunta ao professor
Existem ainda alguns casos em que o infinitivo impessoal admite um sujeito explicito, que é correferente com o da oração subordinante e tem de vir depois do verbo. O exemplo é da Gramática do Português (p. 1934):
Os funcionários querem levar eles as reivindicações ao patrão
Quando não houver um sujeito definido:
Estudar é importante!
Ser feliz é um bom objetivo de vida.
"Estudar" não é sujeito?
No caso específico, o sujeito é indeterminado. Há três tipos de sujeito indeterminado: Com verbo na 3ª pessoa do plural, com verbo ativo na 3ª pessoa do singular, seguido do pronome se e com o verbo no infinitivo impessoal. A regra completa pode ser observada no Só Português:
Sujeito Indeterminado: é aquele que, embora existindo, não se pode determinar nem pelo contexto, nem pela terminação do verbo. Na língua portuguesa, há três maneiras diferentes de indeterminar o sujeito de uma oração:
a) Com verbo na 3ª pessoa do plural:
O verbo é colocado na terceira pessoa do plural, sem que se refira a nenhum termo identificado anteriormente (nem em outra oração):
Por Exemplo:
Procuraram você por todos os lugares. Estão pedindo seu documento na entrada da festa.
b) Com verbo ativo na 3ª pessoa do singular, seguido do pronome se:
O verbo vem acompanhado do pronome se, que atua como índice de indeterminação do sujeito. Essa construção ocorre com verbos que não apresentam complemento direto (verbos intransitivos, transitivos indiretos e de ligação). O verbo obrigatoriamente fica na terceira pessoa do singular.
Exemplos:
Vive-se melhor no campo. (Verbo Intransitivo) Precisa-se de técnicos em informática. (Verbo Transitivo Indireto) No casamento, sempre se fica nervoso. (Verbo de Ligação) Entendendo a Partícula Se
As construções em que ocorre a partícula se podem apresentar algumas dificuldades quanto à classificação do sujeito.
Veja:
a) Aprovou-se o novo candidato.
Sujeito Aprovaram-se os novos candidatos. Sujeito
b) Precisa-se de professor. (Sujeito Indeterminado)
Precisa-se de professores. (Sujeito Indeterminado)
No caso a, o se é uma partícula apassivadora e o verbo está na voz passiva sintética, concordando com o sujeito. Observe a transformação das frases para a voz passiva analítica:
O novo candidato foi aprovado.
Sujeito
Os novos candidatos foram aprovados.
Sujeito
No caso b, se é índice de indeterminação do sujeito e o verbo está na voz ativa. Nessas construções, o sujeito é indeterminado e o verbo fica sempre na 3ª pessoa do singular.
c) Com o verbo no infinitivo impessoal:
Por Exemplo:
Era penoso estudar todo aquele conteúdo. É triste assistir a estas cenas tão trágicas. Obs.: quando o verbo está na 3ª pessoa do plural, fazendo referência a elementos explícitos em orações anteriores ou posteriores, o sujeito é determinado.
Por Exemplo:
Felipe e Marcos foram à feira. Compraram muitas verduras. Nesse caso, o sujeito de compraram é eles (Felipe e Marcos). Ocorre sujeito oculto."
Já no caso do infinitivo, há duas possiblidades: infinitivo pessoal e infinitivo impessoal. Citando a Norma Culta:
Para que seja feita uma correta concordância verbal com verbos no infinitivo, precisamos compreender que o infinitivo pessoal é flexionado e que o infinitivo impessoal não é flexionado.
Verbo encontrar - Infinitivo pessoal (flexionado): (Eu) encontrar (Tu) encontrares (Ele) encontrar (Nós) encontrarmos (Vós) encontrardes (Eles) encontrarem
Verbo encontrar - Infinitivo impessoal (não flexionado): encontrar
Concordância verbal com infinitivo pessoal ou flexionado
O infinitivo pessoal deverá ser usado:
Sempre que há um sujeito expresso de forma clara e inequívoca, mesmo em orações reduzidas.
- Isto é para eu fazer durante o intervalo.
- Isto é para tu fazeres durante o intervalo.
- Isto é para nós fazermos durante o intervalo.
Quando se quiser definir o sujeito através do verbo.
- Acho melhor acabares o trabalho rápido.
- Acho melhor acabarmos o trabalho rápido.
Quando há indeterminação do sujeito, sendo utilizada a 3.ª pessoa do plural.
- Ouvi jurarem fidelidade ao novo rei.
- Vi maltratarem os trabalhadores sem nenhum motivo.
Quando o sujeito da segunda oração é diferente do sujeito da oração anterior, podendo este se encontrar ou não claramente expresso.
- A professora não viu os alunos copiarem no teste.
- O diretor mandou os empregados participarem na reunião.
- Nossa irmã trouxe um livro para nós lermos.
Quando o verbo no infinitivo assume a função de sujeito da oração.
- O fazermos tudo o que é preciso às vezes é cansativo.
- O trabalharem pouco é desmotivador.
Concordância verbal com infinitivo impessoal ou não flexionado
O infinitivo impessoal deverá ser usado:
Quando não houver um sujeito definido.
- Estudar é importante!
- Ser feliz é um bom objetivo de vida.
Com sentido imperativo.
- Parar!
- Respeitar os mais velhos.
Quando o verbo tiver regência de uma preposição, assumido a função de complemento do substantivo, do adjetivo ou do verbo na oração.
- Foram obrigados a passar fome por causa da crise financeira.
- Fui impedida de dar minha opinião.
Quando o verbo tiver regência da preposição a, assumido valor de gerúndio.
- Os meninos estão a nadar muito bem.
- Ficaram a ver o filme em silêncio.
Em locuções verbais, porque é sempre o verbo auxiliar que concorda com o sujeito.
- Os especialistas conseguirão estudar as características daqueles animais.
- Ainda bem que meus pais puderam pagar minha faculdade.
Com alguns verbos causativos e sensitivos que não formam locução verbal (mandar, fazer e deixar, ver, sentir, ouvir) em conjunto com um pronome oblíquo átono, mesmo quando há sujeitos diferentes nas frases.
- Vi-os correr rapidamente.
- Mandaram-na começar a trabalhar.
Concordância verbal com infinitivo impessoal ou pessoal
Quando o sujeito é o mesmo nas duas orações, é facultativa a escolha do infinitivo pessoal ou impessoal, mesmo que o sujeito esteja oculto. Contudo, nestas situações, há uma maior preferência dos falantes pela forma no singular.
- Viemos para transmitir as palavras do diretor.
- Viemos para transmitirmos as palavras do diretor.
- Lá estarão para resolver o problema.
- Lá estarão para resolverem o problema.
Quando o verbo se encontra na voz passiva ou na voz reflexiva, sendo um verbo pronominal, ou quando for um verbo de ligação, é facultativa a escolha do infinitivo pessoal ou impessoal. Contudo, nestas situações, há uma maior preferência dos falantes pela forma no plural.
- Os atletas treinaram muito para se tornarem os melhores.
- Os atletas treinaram muito para se tornar os melhores.
- Foram informadas as decisões a serem tomadas imediatamente.
- Foram informadas as decisões a ser tomadas imediatamente.
Com alguns verbos causativos e sensitivos que não formam locução verbal (mandar, fazer e deixar, ver, sentir, ouvir) e que não aparecem em conjunto com um pronome oblíquo átono, é facultativa a escolha do infinitivo pessoal ou impessoal.
- Deixei entrar as crianças.
- Deixei entrarem as crianças.